Easy | A Comédia Humana

por Cantão

No fim de setembro, a Netflix lançou a comédia dramática Easy, série escrita, produzida, dirigida e editada por Joe Swanberg —  acúmulo de autoria bastante raro na TV. Curiosamente, a série muda a perspectiva estética a cada episódio, como se diferentes roteiristas e diretores estivessem se alternando. Essas alterações não comprometem a unidade, nem o sentido de conjunto. Ao contrário, o movimento garante versatilidade para acompanhar o contexto de cada história.

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Swanberg utiliza a câmera com intenção, sem uma suposta neutralidade, lembrando que ali existe um narrador. Por isso também a série soa bastante literária.

Nascido em Detroit, nos Estados Unidos, Swanberg tem 35 anos e faz parte do chamado Mumblecore, movimento do cinema independente americano que valoriza uma estética neorrealista e abre espaço para a improvisação.

A primeira temporada de Easy tem apenas oito episódios, cada um com cerca de meia hora de duração. Todos têm um breve prólogo, seguido por um lettering ilustrado de acordo com a história da vez. A linguagem visual é bonita, mas sem afetação. Os episódios funcionam de maneira autônoma, como ocorre em Black Mirror, e aqui também a tecnologia desempenha um papel central. Personagens que são figurantes em determinados episódios ressurgem como protagonistas em outros, e vice-versa.

A dinâmica me fez pensar em A Comédia Humana, conjunto de romances de Balzac (considerado o pai do realismo na literatura), na qual cada livro tem características próprias, mas todos, em conjunto, buscam retratar a vida da sociedade moderna em Paris, em especial a burguesia do século 19. Em Easy, os episódios (que poderiam ser contos) formam um retrato da vida em uma grande cidade dos nossos tempos.

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Em Easy, os questionamentos que permeiam o mundo atual, como o uso das redes sociais, o impacto do feminismo e o discurso da sustentabilidade, são postos com naturalidade pelo enredo. Swanberg não parece interessado em julgar, mas sim em observar. Se queremos pensar sobre as questões contemporâneas com profundidade, essa me parece uma posição mais sabida, pois não exclui a ambivalência da condição humana.

acompanhe o jornalista, há um deslocamento de protagonismo, quando passamos a seguir os passos dos irmãos e os desafios que enfrentam com o crescimento do negócio. No fim, a vida adulta chega para todos — sem lição de moral, apenas uma constatação.

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Para quem quiser assistir em sequência, os oito episódios rendem uma maratona de quatro horas. Humor e melancolia na medida em uma das melhores produções da TV em 2016.