Fe Moreira conversa com Mayara Boaretto

por Fernanda Moreira

Encontrar ferramentas para desacelerar o automatismo da rotina é uma das minhas buscas – e necessidades – no dia a dia. Respeitar a pausa e o respiro, cuidar do tempo e da minha vontade de contemplação não são puro capricho: é saúde. E assim, pesquisando sobre saúde da mulher, descobri a Iamaní, cujo modelo de negócio é sustentável, biodegradável e totalmente direcionado à mulher e nossos ciclos. Puxei a Mayara, parteira e uma das criadoras, para um bate-papo… Vale muito a leitura: 

Como surgiu a Iamani? Ter a saúde da mulher como foco é um diferencial… 

A Iamani nasceu do meu encontro com a Ligia. Desde a primeira vez que nos vimos, já se tornou minha amiga, uma das pessoas que eu mais admiro nessa vida, e que tenho a grande honra de ser sócia também. 

Eu sou obstetriz e parteira e fiz uma formação na Tailândia de Yu Fai, que são cuidados tradicionais do pós-parto que envolvem massagens, chás e infusões com plantas medicinais, sauna, vaporização do útero… Atendi bastante em São Paulo e o Zé (irmão da Lígia), que era meu vizinho, deu de presente para ela um atendimento comigo no pós-parto do Gael. Logo depois que fiz esse atendimento de cuidados, quando preparei uma sopinha de missô e um chá especial para mulheres que estão amamentando, que começamos a falar sobre nossos propósitos e projetos de vida: o Mulheres da Terra e o Casa Mães Para Sempre (que agora se tornou Instituto do Luto Parental). (Mais detalhes desses projetos na última pergunta da entrevista). 

Começamos a pensar em como poderíamos unir nossas forças para gerar recursos para os projetos, até que… “plim” – falei para ela:  “Eu tenho uma ideia de fazer uma marca de chás… exatamente esse que você está bebendo”… e ela falou “Vamos fazer isso!!! Tem que ser um produto que faça bem para todo mundo: para as pessoas que consumirem, para os agricultores, para a Terra e também para as pessoas que forem impactadas pelos nossos projetos”.

E assim nasceu a Iamani, uma marca de chás orgânicos e funcionais criada por uma mãe e uma parteira, que tem como propósito servir saúde e afeto para as pessoas, através de xícaras de chás, feitos a partir de plantas orgânicas!

Vocês levantam muito a bandeira do atóxico, alertando que alguns chás podem conter substância tóxicas, até mesmo nas embalagens. Conte mais sobre isso?

Sinceramente, antes de começar a trabalhar com produção dos chás em sachês, nós não fazíamos idéia da composição e do material que eram feitos os papéis-filtro dos sachês. Então nossa primeira produção, fizemos com o material que havia no mercado, do qual é feito todos os chás do Brasil. Aí logo descobrimos que a grande maioria dos sachês de chás que usamos no Brasil passam por vários processos químicos para clareamento e são feitos e colados com materiais sintéticos.

Vou citar aqui um estudo para vocês, para poder embasar o que estou falando: de acordo com um estudo da American Chemical Society, alguns tipos de papéis-filtro de sachês para chás podem conter traços de plástico, principalmente nos materiais que eles usam para selar (colar) o saquinho do chá. Os pesquisadores da Universidade McGill testaram quatro marcas populares de chás vendidas em supermercados dos EUA, por exemplo, e descobriram que em um único saquinho de chá convencional, pode-se liberar 11,6 bilhões de microplásticos e 3,1 bilhões de partículas nano plásticas na água. Estes microplásticos são encontrados em muitos alimentos e bebidas (incluindo garrafas de água), mas o estudo revelou que os níveis liberados pelos saquinhos de chá eram milhares de vezes maiores do que outros produtos.

Imagina quando soubemos disso? Não fazia sentido trabalhar com plantas orgânicas, todo o cuidado que temos com a cadeia de produção… e usar um papel-filtro com partículas de plástico. 

Começamos uma pesquisa junto ao nosso fornecedor para trabalharmos com um papel-filtro 100% biodegradável e compostável… e conseguimos. Por isso, podemos dizer que somos a primeira marca brasileira a trabalhar com sachês 100% biodegradáveis, de origem vegetal! O nosso papel filtro é feito a partir da fibra de um tipo de bananeira Abaca e a cola que usamos também é de origem vegetal. Nós acreditamos que a natureza é a tecnologia mais avançada que existe. Por isso, nossos chás são orgânicos com sachês feitos a partir da própria tecnologia das plantas e da natureza!

Ahh! E para finalizar… sabe aquele plastiquinho que vai envolta das caixas de chás e de vários outros produtos? Para o caso dos chás, é obrigatório pela ANVISA, para manter o controle de qualidade do produto… e isso também foi doloroso pra gente, pois ficamos imaginando um monte de plástico na natureza depois… E temos uma boa notícia: nós também estamos produzindo com material 100% biodegradável!

Que máximo. E como é o processo de produção dos chás, da agricultura até ele ficar prontinho?

Nós trabalhamos com pequenos agricultores orgânicos e familiares e também cooperativas, que ficam principalmente nos estados do Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Bahia.

Em nossos chås vocês vão encontrar Gengibre, Canela, Cúrcuma, Camomila, Melissa, Folha de Amora, Folha de Framboesa, Capim-limão, Erva-doce, Funcho, Hortelã, Sálvia, Casca de laranja, Casca de limão, Cacau, Pimenta do Reino e Chá Verde – 100% orgânicos, respeitando os ciclos da Terra, das abelhas, dos passarinhos, das águas…

O processo de produção é simples: compramos tudo de cooperativas e de agricultores familiares e orgânicos. Também temos um projeto em conjunto com dois coletivos de agricultores no Paraná e Santa Catarina, onde investimos na plantação de 1000 mudas de framboesas orgânicas para os nossos chás focados em saúde da mulher. 

O processamento é feito por uma indústria parceira, que pega as matérias-primas e tritura para ficar no corte de sachê e depois mistura para fazer os blends de nossas receitas.  O envase é feito por outra indústria parceira, que coloca os blends das plantas nos sachês de chás, feitos também à base de plantas 100% biodegradáveis e compostáveis. As nossas caixinhas e os envelopinhos em que vão os chás são feitos de papel e impresso com tinta atóxica, à base de água, embalagens essas 100% recicláveis. E para finalizar o BOPP, que tem uma aparência tipo de plástico, é um lacre obrigatório pela Anvisa, mas o nosso é o primeiro do mercado que também é de origem vegetal e 100%  biodegradável.

Nossa natureza é cíclica e com muitas oscilações hormonais. Como os chás podem contribuir para a estabilidade da saúde física e emocional da mulher?

Os chás  e as infusões são utilizadas como aliadas no cuidado com nossa saúde e bem-estar desde que o mundo é mundo. Depois da água, é essa a bebida mais consumida no planeta. As plantas têm tecnologias próprias com o potencial de nos trazer benefícios em todos os níveis de nossa saúde.

Falando sobre saúde cíclica, nós criamos um blend com foco na saúde da mulher, o “Ciclos Femininos”, que contém várias plantas super especiais em especial, as folhas de framboesas do #JardimIamaní (são 2 blends numa mesma caixinha, um criado para tomar nos dias que antecedem o ciclo menstrual e outro durante o período menstrual).  E outros blends focados na saúde da mulher – o “De Mãe Para Mãe”, que é o primeiro e único chá brasileiro com plantas orgânicas criado especialmente para mulheres que estão amamentando, e o “Mulher Madura” – feito especialmente para mulheres que estão vivenciado o período do climatério ou já passaram pela menopausa.

Esses são nossos 3 blends focados em saúde da mulher. Temos muitos outros blends, como Bons Sonhos, Boa Digestão, Super Imune, Super Detox (ayurvédico), Acalma a Alma – que criamos junto com a Bela Gil, Chá com Cacau – que criamos junto com a Amma Chocolate, entre outros. 

Quais os desafios de levar um empreendimento, hoje, com todo esse viés?

São muitos. Estamos vivendo uma das maiores crises sociais, econômicas e ambientais que já existiu em nosso país. Todo mundo vê o aumento dos preços todos os dias, desde combustíveis até alimentos mais básicos.  O desmatamento atingiu recordes nunca antes vistos, a PL do Veneno e a  liberação de agrotóxicos cada vez mais perigosos, proibidos em todos os lugares do mundo. Está tudo interligado e isso impacta na vida de todas as brasileiras e brasileiros. Mas estamos fazendo o que é possível para fortalecer os agricultores que mais entendem o que é resistência: os agricultores orgânicos num Brasil, que é um dos países que mais consome agrotóxico no mundo.

Quais os sonhos da Iamaní? 

Temos muitos, mas gostaria de destacar aqui que, em primeiro lugar, nós sonhamos em ter uma empresa próspera, que possa gerar renda para os nossos projetos sociais – verdadeiras fontes de inspiração para a criação da empresa. Conto um pouco sobre eles:

A ‘Casa Mães Para Sempre’, que nasceu em 2019, como um pequeno coletivo e se formou para dar abraços e escuta a quem passa pela morte de um filho. Foi idealizada pela Ligia, a partir do luto gestacional de sua filha Laura, no final da gestação, em março de 2015. Desde sua formação, oferece Rodas de Apoio ao Luto, atendimento psicológico, formação para profissionais da saúde em Humanização do Luto e se  tornou em 2022 o ‘Instituto do Luto Parental’. 

O ‘Mulheres da Terra’, um projeto que eu comecei quando tinha 16 pra 17 anos –  de registros de saberes ancestrais de mulheres (parteiras, raizeiras, benzedeiras e lideranças sociais e espirituais). Fizemos um documentário que leva o mesmo nome sobre os encontros no decorrer de 10 anos com 3 parteiras tradicionais do nordeste do Brasil. Tudo o que arrecadamos com o filme, repassamos para as comunidades e durante a pandemia realizamos campanhas de captação de recursos, onde destinamos mais de 50 toneladas de alimentos e artigos de higiene.  Depois disso, já estive pesquisando e registrando histórias de vida e saberes de mulheres na Índia, Nepal, Indonésia, Tailândia, México, Guatemala e Colômbia – e iremos compartilhar essas histórias através de uma plataforma online.

Conhecer a May deu uma aquecida no coração. Uma mulher que acredita na vida e, sobretudo, na capacidade de transformação e evolução humana. Me fez enxergar que o meu compromisso com o planeta – e consequentemente comigo – precisa ser diário e gradativo, mas constante. Como é bom ver mulheres na maior potência: sonhando, acreditando e realizando. Que venham mais histórias.