Escrevi um livro, e agora?

por Fernanda Moreira

Recebi do Cantão o desafio de escrever sobre o processo criativo do meu primeiro livro, “Mar é sempre beira pra quem tem medo de fundo”, lançado há dois meses pela Crivo, editora mineira. Me dei conta de que não tenho elaborado ainda o que ele significa pra mim: uma palavra no mundo. É que antes mesmo dos primeiros versos ganharem contornos, um livro já nasce em sonho, em ideia, em possibilidade – coisa que toda literatura já é, em si. 

Foi em março de 2020 meu primeiro contato com a Crivo e combinamos de lançar o livro alguns meses depois. Acontece que, na hora de enviar os originais – os textos prontos – travei e não mandei. Era um compilado de coisas inéditas escritas desde 2012, cuidadosamente selecionadas por mim. Será que estavam mesmo prontos esses textos? 

De forma anacrônica, digo que, mês passado, em entrevista para um canal de TV em Aracaju, a repórter me trouxe a seguinte reflexão: e se você é quem não estivesse pronta para o livro? Isso me deu um tilt. Os textos, de fato, estavam lá: escritos, revisados, disponíveis. Mas, óbvio, eu não. Eu não estava pronta.

Passaram-se dois anos e meio até o lançamento acontecer. E como é emocionalmente exaustivo gerir um projeto próprio com toda burocracia que o mercado exige. Eu sou digna dessa realização? Enquanto entrava em um looping de me sentir ou não merecedora do feito, ia fazendo. Fazendo. Até que fiz. 

O processo criativo pode ser muito sabotador e limitante, se a gente se confunde no meio do caminho. E eu me ative a mim para não desistir: enquanto a Crivo se responsabilizava pela revisão, impressão e envio do material, eu cuidava de absolutamente todo o resto. Jogamos juntos, que sorte. Quem assinou a orelha do livro foi a atriz e poeta Bianca Ramoneda, uma amiga querida. Livros esgotados na livraria, horas depois de serem lançados, e, agora, poucas unidades no site da editora. 

Uma vez escrevi “de vez em quando, desaprendo a linguagem do medo”. São nesses vislumbres de coragem que atuo, que ajo, que desejo, e foram por seguidos vislumbres como esses que lancei minha palavra no mundo, agora em papel. Sempre digo que a Ladrilha, meu projeto de ocupação da palavra no espaço público, é, antes de tudo, um projeto de ocupação de mim mesma. E se ocupar de si é exercício contínuo. É uma fé. 

Eu tenho exercitado a fé em mim. E eu tenho me encorajado pra vida. Todo dia. Será que existe o sentimento de estar 100% pronta? Eu ainda não experimentei, mas experimento me creditar no mundo. E me dar as mãos. E ir. Parafraseando Drummond, que dizia “amar se aprende amando”, eu digo, com toda licença: fazer se aprende fazendo. E é isso o que eu te peço agora: faça. 

Ps: as fotos que ilustram esse post são assinadas por Pri Pach. Elas registram o lançamento do livro, em 15 de agosto, na livraria Janela, Rio de Janeiro. 15 de agosto é o dia de Iemanjá, na Umbanda.