Série “Me Deixa Passar” | Su Tonani

por Cantão

Conhecida desde que publicou um destemido relato sobre assédio no blog feminino #AgoraÉqueSãoElas, do jornal Folha de São Paulo, a figurinista Su Tonani se viu no centro das atenções de um caloroso debate sobre os efeitos criminosos que o machismo pode ter.

Ao mesmo tempo em que seu relato foi lindamente abraçado pelo movimento “Mexeu Com Uma, Mexeu Com Todas”, ela viveu o pior do que se poderia esperar após o assunto ganhar a Internet e os holofotes.

Sua história virou a história que o mundo machista insiste em contar. Su foi culpada pela violência que ela mesma vivenciou. Seu relato virou o caso da mulher sedutora, agora passional e vingativa. Da mulher que provocou e mereceu. Da amante rejeitada que quer aparecer.

Todos os dias, e especialmente no Dia da Mulher, a história real e cheia de coragem de Su é pura inspiração pra gente. Na série especial “Me Deixa Passar”, mulheres que admiramos passam o batom vermelho e pedem licença pra continuar passando, quebrando barreiras e nos enchendo de orgulho por aí. 🙂

Em entrevista exclusiva, ela abre o coração e comenta sobre símbolos de resistência e como nós podemos reverter esse jogo. Confere só:

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Você não comentou muito sobre o assunto na época. Fale um pouco como se sentiu depois do seu relato e como foi ficar nesse fogo cruzado.

Nós, mulheres, nos acostumamos com as olhadas, cantadas, nós já entendemos que é essa a escravidão que nós vivemos, infelizmente. Mas acho que algumas barreiras não podem ser cruzadas mesmo apesar dessa imposição social. O que aconteceu na minha vida é que essa barreira foi brutalmente cruzada. Num lugar tão distante do real que você pensa “não é possível que estou vivendo isso”.

E a decisão de soltar esse relato, foi uma decisão que invadiu muito a minha vida. Não recebi um pedido de desculpa, não ganhei absolutamente nada com isso e só me abri a ser julgada, perseguida e xingada. Imagina quantas mulheres deixam de falar por esse medo?

Eu falei porque achei que era importante dizer. Minha exposição foi pra bater no peito. Eu fiz um relato pra deixar claro que eu não sou invisível. Pra deixar claro que a dona do meu corpo sou eu. Pra questionar até quando vamos ficar invisíveis. Não é sobre eles. É sobre nós, mulheres! Me senti muito insignificante e foi muito revoltante. Todo mundo tem sua importância e seu lugar no mundo. É o meu corpo, sou eu! Ninguém tem o direito de te invadir assim.

Tudo o que aconteceu acendeu um debate fundamental. O que você acha que falta pra elevar ainda mais a discussão sobre as questões femininas nos dias de hoje?

As mulheres se uniram demais, aumentaram a voz e isso foi lindo. Já existia o movimento do “Mexeu Com Uma, Mexeu Com Todas”, que só apoiou o meu relato e me deu mais força. Mas acho que ainda falta muito tempo e esforço para tornar mais frequente a discussão sobre o feminismo e sobre o assédio. O machismo está tão enraizado na nossa cultura que nem percebemos! Ainda falta muito e tenho vontade de fazer muito mais – de conhecer mais sobre o assunto, me inteirar, ler mais.

Fale um pouco do porque você acredita no poder do batom vermelho como símbolo de resistência e empoderamento.

Acredito no batom vermelho como símbolo de poder como qualquer outro símbolo que seja de escolha dessa mulher, que não seja imposto nem pelo machismo, nem pelo feminismo. Tudo aquilo que você acredita, quer e é seu por direito é uma forma de empoderamento. Somos livres pra deixar os pelos crescerem, pra raspar, passar batom, casar…

Acredito no poder do batom vermelho como liberdade de escolha. Como figurinista, penso que a forma como você se veste e se porta é sempre o norte da manifestação de quem é você.

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Há alguma pergunta que você gostaria que te fizessem e não fizeram? Algo que você queira acrescentar, mas ainda não teve oportunidade?

Na época o que eu mais senti falta foi das pessoas me perguntarem como eu estava me sentindo. Ninguém pergunta como você está se sentindo. É só “o que você vai fazer?”, “como você vai punir?”. Me questionaram mais se eu ia processar o agressor, a empresa onde isso aconteceu, todos que foram coniventes com isso. É muito doloroso constatar que é muito mais sobre eles do que sobre a gente. Eu só queria ser respeitada, que tomassem consciência e entendessem o quão sério e traumatizante é para alguém sofrer assédio. Isso tem que mudar!

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E para você que acha que manifestos e relatos fortes como esses enfraquecem o feminismo, fica o nosso recado: nós só ficamos mais fortes. Não tem mais volta.

Créditos das fotos: Juliana Rocha