O Brasil registrou, em média, 135 estupros por dia em 2016. A cada quatro minutos, uma mulher foi agredida no carnaval carioca daquele ano (isso só levando em conta as que pediram socorro à Polícia Militar pelo telefone).
A resposta? Um grito, um pedido, um manifesto silencioso (mas mais que necessário) e purpurinado: “Não é Não!”. A ideia da tatuagem do “Não é Não” partiu de um grupo de amigas que, em janeiro de 2017, decidiu transformar a indignação diante de tantos casos de assédio em um movimento de luta por uma sociedade mais igualitária.
Aisha Jacob (27 anos) e Nandi Barbosa (28 anos), são duas das idealizadoras do projeto. Tudo começou quando 40 mulheres se uniram para fazer uma vaquinha e produzir a primeira leva de tatuagens para o carnaval daquele ano. Foram produzidas 4 mil tatuagens (com o dinheiro arrecadado pelo Coletivo) que foram distribuídas gratuitamente na folia de rua do Rio. Sem dúvidas, esse virou o verdadeiro grito de carnaval!
Na série especial “Me Deixa Passar”, mulheres como elas, passam o batom vermelho e pedem licença pra continuar passando, quebrando barreiras e nos enchendo de orgulho por aí.
Aqui elas comentam mais sobre esse movimento que só inspira a gente:
O que o batom vermelho representa pra vocês?
AJ: É muito legal pensar que até um tempo atrás o batom vermelho era visto como algo vulgar (e quase um responsável pelo assédio), e nós subvertemos isso. Agora é sobre quem é o responsável pelo assédio, que é o assediador, o responsável real sobre isso. Como a Jout Jout bem disse no vídeo “Não Vou Tirar o Batom Vermelho”, é sobre o entendimento da sociedade que quem é o responsável pelo assédio é o agressor, e não a gente. Não estamos provocando!
NB: Hoje, o batom vermelho virou um dos símbolos de resistência e luta feminina. Ele ganhou um significado além das questões estéticas, de beleza. É autoafirmação, empoderamento e liberdade de escolha para as mulheres. Um jeito de mostrarmos que machismo nenhum vai ditar o que vestimos, fazemos ou falamos. Respeita as mina!
O que você acha que falta pra elevar a discussão sobre o feminismo nos dias de hoje?
AJ: Acho que o que mais falta são dados. A violência de gênero é algo que sentimos no dia a dia, e isso sempre foi banalizado. A gente não tem informação sobre isso, e historicamente, isso sempre foi algo natural. Nós só começamos a problematizar essa questão agora. Pra gente conseguir continuar essa discussão, precisamos de dados reais. Fizemos uma pesquisa pós-carnaval sobre relatos de violência contra mulheres e os números foram bem bizarros, bem equivocados. Basta ser mulher pra saber que aqueles números não fazem sentido. Em Pernambuco encontramos uma reportagem falando que no Estado só ocorreram 7 casos de assédio durante a folia. É quase uma piada, já que este é um dos Estados mais violentos do Brasil. Esses relatos precisam existir pra gente poder cobrar uma postura coerente, uma mudança do poder público. É isso que falta pra gente falar da real importância do feminismo existir.
Qual é o maior desafio em estar à frente de um movimento que fala sobre assédio sexual?
NB: Existem vários desafios, mas acho que um dos maiores é conseguir superar o machismo, tão presente em nossa sociedade. Às vezes ele é mais fácil de perceber e mais violento, evoluindo para a agressão física, verbal ou psicológica; e às vezes ele é mais sutil, quase não se nota, mas ainda assim causa muitos danos. E esse pensamento machista, quando passado de geração em geração, pode ser difícil de desconstruir e combater. E percebemos que muitas pessoas ainda não entendem bem o que é o assédio sexual, e confundem com paquera, com flerte. Assédio não é paquera, assédio é constrangimento, desrespeito e violência. Depois do “não” é tudo assédio, e a mensagem é bem simples: não é não.
Qual sua mensagem para o Dia da Mulher (e todos os outros dias)?
AJ: Mulheres, conversem entre si! Se unam. Nós temos muito poder juntas, nós temos mais força quando estamos juntas. Nós precisamos aumentar nossa rede, olhar ao redor e se reconhecer como mulher. Ter mais empatia, mais sororidade. Se aproximem de mulheres que vocês admiram, troquem! Precisamos potencializar esse assunto levando essas questões para mesas de bar, grupos de whatsapp… juntas temos voz!
NB: Minha mensagem é de suporte e empatia para todas as mulheres. Que a gente consiga crescer cada vez mais essa rede de mulheres fortes e empoderadas, que se apoiam e ajudam em momentos tão difíceis. Nós do Coletivo Não é Não acreditamos nesse caminho de conscientização e combate ao assédio, e pensamos que juntas é possível mudar essa realidade. Juntas somos mais fortes!
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Como as meninas dizem, ainda que a tatuagem saia com água e sabão, a mensagem veio para ficar. As vulnerabilidades nos conectam e nos fortalecem. Fique de olho em tudo o que o coletivo Não É Não está aprontando por aí! 😉